segunda-feira, 9 de março de 2015

ESCUTAR A VIDA



Caríssimas e caríssimos,
Há coisas a mais? Consumimos (e desejamos vender) o supérfluo?

À saída do espaço comercial do lugar onde vivemos observamos um pedaço do mundo… E identificámos mais nossas a proposta do irmão Aloïs de Taizé (1): “Olhemos para o nosso modo de vida e procuremos simplificar o que pode ser artificial e o que é excessivo. Simplificar a nossa vida pode ser fonte de alegria. Abramos espaços de partilha: o que podemos dar e receber?”

Fraternalmente,
grão de mostarda

(1) «Quatro propostas para «ser sal da terra», ver http://www.taize.fr/pt_article17507.html


A NOITE DAS COISAS A MAIS…


O “centro comercial” (se assim se pode chamar a um espaço com pouco mais de uma dezena de lojas) encerrava. No pequeno corredor, muitas vitrinas exibem um papel colado: “Aluga-se loja”. Ao comentário de que cada vez são mais os estabelecimentos vazios, a senhora tem resposta pronta: “Que havemos de esperar: hoje há coisas a mais e as pessoas já têm tudo”. 

Era já noite. As preocupações do dia parecem perder peso, quando deixamos pousar o comentário daquela mulher, cujo encargo era fechar a porta de acesso ao “centro comercial”. E no coração ecoaram palavras do irmão Aloïs de Taizé: “E preciso encontrar um bom equilíbrio entre as necessidades vitais e o desejo de ter sempre mais.”

“Há coisas a mais…” Na verdade, continuamos a viver num mundo de montras, fazendo um sistemático apelo ao consumo; não o consumo inteligente, capaz de responder às necessidades humanas, mas sim a uma total adição ao desejo de tudo ter, de tudo possuir… Temos dois modelos de sapatos, há comprar mais dois; oferecemos aos garotos sumos com sabor a laranja e a maracujá, é necessário então ter na mesa também outras garrafas com sabor a maçã e ananás e, junto ao prato da refeição, um “tablet”… A lista poderia prolongar-se indefinidamente: o telemóvel que ainda funciona trocado por um outro que já inclui um pequeno “truque” para ver em tempo real os resultados do futebol; a aquisição da cafeteira do café por uma que também consegue fazer um “galão” logo de manhã cedo, quando apressados corremos para o trabalho.
E assim julgamos estar a dar resposta ao anseio de felicidade que o nosso coração anseia…

Como o actual modelo de sociedade já nos tornou adictos compulsivos, quando alguém pretende resolver uma situação de desemprego ou de “início de vida” a única saída que vislumbra é a de abrir um negócio – a negação do ócio… Existem mesmo programas nas instituições da Administração Pública destinados a apoiar essa solução; os bancos prometem financiamento aos jovens empresários e aos que pensam reiniciar uma nova carreira, para que abalancem a ter o próprio negócio, slogan tão actual nestes “tempos de oportunidades”, para usar o jargão de políticos, sociólogos e comentadores. Depois anunciam-se números espectaculares de abertura de pequenas empresas, sem nunca contabilizar e dar conhecimento dos problemas acrescidos de quantos se viram forçados a fechar portas, quantas vezes logo ao fim de meses de as terem aberto.

“Há coisas a mais…” COISAS que pretendem ser a respostas a falsas necessidades. E assim tudo parecerá razoável e justificado, porque o coração facilmente se afeiçoa ao que consegue dominar, ao desejo pelo desejo. Passando este a ser o único horizonte da nossa vida, o dom da vida será remetido para o absurdo… A propósito, Eckart Tolle recorda-nos: “O ego identifica-se com o ter, mas a sua satisfação por ter algo é relativamente superficial e de pouca duração. Uma característica intrínseca ao ego é uma sensação de insatisfação (…)” (*).
Como não deixar-me encerrar nesta insatisfação? Que caminhos percorro para que em mim germine o essencial da minha humanidade? Fazendo a aprendizagem de que a realização humana – o SERMOS – não depende das coisas exteriores, o nosso coração buscará, como as raízes da árvore, o terreno necessário para se ALIMENTAR.
(*) Eckart Tolle, “Um novo mundo – Despertar para a essência da vida”, Pergaminho, 2006

grão de mostarda



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