sábado, 20 de agosto de 2011

ESCUTAR A VIDA

Caríssimas e caríssimos,

Viver com o coração reconciliado, mesmo quando o mal se atravessa nas relações humanas, não é fácil para ninguém. Nesta semana, Adérito Marcos coloca-nos a questão da urgência do perdão… “Chegarmos ao limite de desejarmos algum mal a esse outro, estaremos a pisar um terreno pantanoso com consequências imprevisíveis”.

Um dia, o irmão Roger escreveu: “Considera o próximo na totalidade da sua existência e não apenas numa etapa da sua vida”. Somente nesta atitude seremos capazes de “ver apenas um irmão” em quem nos ofendeu ou maltratou, como sublinha Adérito Marcos, que conclui: “Só Amor importa (…) mesmo quando tudo parece perdido e votado ao mal”.

Com estima fraterna,

grão de mostarda


Do desafio de compreender e aceitar o outro como nosso igual 



 

Seremos capazes de olhar para esse outro, especialmente aquele que nos ofendeu e maltratou, que consideramos nosso inimigo, e ver apenas um irmão perdido, longe dos caminhos do amor, da amizade?

 



Todos temos sempre alguém, um vizinho, um familiar, um colega do trabalho, ou até um antigo companheiro de infância, com quem honestamente não simpatizamos. E são muitas as razões que nos levaram a esse estado de incompatibilidade. Uma zanga antiga dos tempos da escola. Uma discussão mais acesa num dia em que estávamos (ou essa pessoa estava) menos bem-disposta. Uma qualquer expectativa que tínhamos a respeito dessa pessoa e que se gorou. São inúmeras e incontáveis as razões, infelizmente, que nos podem afastar do outro. Em casos mais graves, até pode dar-se o caso dessa animosidade ser presente e contínua, algum colega ou superior hierárquico quiçá, que nos demonstra amiúde recíproca aversão pessoal ou mesmo usando de algum poder sobre nós, nos ofende ou calúnia (como isto é comum nos ambientes de trabalho …), colocando-nos, por vezes, em situações que usualmente classificamos de “total incompatibilidade” pessoal.
E quantas vezes, por circunstâncias diversas, não nos vemos a lidar com essa pessoa, objecto da nossa “aversão”, num contexto social diferente onde a comunicação flui mais livremente e descobrimos que afinal, esse alguém, é tão frágil, tão humano e necessitado de atenção, de carinho e amor como nós, afinal, veja-se (!), descobrimos com espanto nessa pessoa um igual! E daqui pode nascer a reconciliação baseada no conhecimento, na compreensão e na descoberta do outro, com qualidades e defeitos. Estes são os casos com fim feliz.
Os outros casos são, por norma, mais complicados. Guarde-nos Deus de chegarmos ao limite de desejarmos algum mal a esse outro, pois se tal acontecer, estaremos a pisar um terreno pantanoso com consequências imprevisíveis para a felicidade e a paz que ansiamos como filhos do Deus-paizinho, pois esse outro é um nosso igual, mesmo com todos os seus defeitos, as suas más acções, a sua “falta de carácter” …
E o desafio começa aqui: sermos capazes de compreender o outro, mesmo que reprovando e repreendendo as suas acções, aceitando-o como nosso irmão, nosso igual na imperfeição e na busca do amor… ainda que por caminhos ínvios. 
Seremos capazes de olhar para esse outro, especialmente aquele que nos ofendeu e maltratou, que consideramos nosso “inimigo”, e ver apenas um irmão perdido, longe dos caminhos do amor, da amizade?
Se chegarmos até aqui estaremos a trilhar o caminho revolucionário que Jesus nos indicou quando disse “Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos aborrecem” (1).  
E descobrimos uma verdade eterna de Deus: só o Amor importa na construção da Paz, connosco próprios e com o outro, mesmo quando tudo parece perdido e votado ao mal. 
(1) Lucas 6,27

Adérito Marcos
42 anos,  irmão leigo membro da Paróquia S. Tomé, da Igreja Lusitana Católica Apostólica Evangélica – Comunhão Anglicana, Castanheira do Ribatejo; membro do grão de mostarda/comunidade fraterna de reconciliação; licenciado e Doutorado em Engenharia Informática, agregado em Tecnologias e Sistemas de Informação, professor associado da Universidade Aberta.
Contacto: aderito.marcos@gmail.com

•Ilustração: Ícone Bizantino, Sermão da Montanha

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