Caríssimas e caríssimos,
durante esta semana
fomos descobrindo nos “pensamentos em busca” trilhos de uma peregrinação para o
sentido da VIDA. Hoje, na reflexão ESCUTAR A VIDA (ver ANEXO) encontramos
sinais reveladores de que a fidelidade à sede que invade o nosso SER
conduzir-nos-á sempre a relações humanizadoras.
Fraternalmente,
grão de mostarda
BUSCA DO SENTIDO DA VIDA
AOS ENCONTROS HUMANIZADORES
Não conhecemos este homem magro, de bigode apurado e já com
cabelos brancos… Sentou-se na mesa do café com o olhar vazio para a parede de vidro,
da qual se avistavam os carros apressados e as pessoas que entravam e saíam dos
prédios circundantes.
Pediu à senhora “um café, por favor” com uma pronúncia que
confirmava o que a sua fisionomia já transparecera. Perguntámos: “De onde é o
senhor?” “Da Moldávia…” A conversa foi dando as voltas da vida daquele homem de
52 anos, mas que parecia já ter mais de 60, porque antes de contar o que fazia,
preferiu dizer: “Tenho um curso de carpinteiro, mulher e três filhas na minha
terra…”. E logo se percebeu que agora não fazia nada. Fora contractado para
trabalhar em Portugal para exercer a sua profissão, mas o patrão português
apenas lhe pagara o salário de servente. Aceitou anos a fio aquela situação:
“Tinha de aceitar as condições porque a família precisa de comida.” E agora?
“Agora estou sem trabalho. E levantando-se, disse: ”Desculpe, vou-me embora,
porque aquele parece que me arranjou um trabalho para hoje.” Aquele era um
outro homem de idêntica fisionomia que aparecera frente ao vidro do café…
Já era noite. Mesmo assim pensou-se que iam gostar da visita.
Encontramos a filha, ainda jovem, perturbada com a situação da mãe. Já havia
telefonado durante o dia a dizer que a mãe não poderia ir para a fisioterapia…
A senhora, que em Dezembro vai fazer 80 anos, está sentada na cadeira de rodas,
bem agasalhada e acarinhada com desvelo pela filha: “A minha mãe já não
consegue ir à casa de banho há oito dias e está cheia de dores.” Três dias
antes fora ao hospital fazer uma TAC, a pedido de uma fisiatra amiga que se nos
oferecera para proporcionar tratamento adequado à situação da senhora, porque
onde andara há mais de um ano “não lhe faziam nada”, como a filha sempre se
lamentava. A TAC revela metáteses ósseas. “Não pode ir para a fisioterapia, foi
o que me disseram no hospital”, diz a filha com o rosto apertado para não
deixar saltar as lágrimas. Mas agora o que era necessário era aliviar as dores
da mãe… Telefona-se para um hospital onde estaria um médico conhecido. Não
estava. Mas a médica de serviço prontificou-se em aceitar a senhora para lhe
fazer uma limpeza aos intestinos.
Médica e enfermeira cuidaram em acalmar a filha que, na sua
ternura tão amável para com a mãe, não conseguia disfarçar a dor que sentia.
Médica e enfermeira trataram com delicadeza infatigável a senhora. Quase três
horas depois o seu rosto já estava menos pálido. A filha colocou-a na cadeira
de rodas. E enquanto a agasalhava, sussurrando carinhosas palavras de
tranquilidade, ela esboçou um sorriso. A humidade da noite exigia maiores
cuidados. De regresso a casa, a senhora aceitava, com um olhar suave, os beijos
de despedida…
Olhamos os gestos de compreensão e de ternura destes dois
momentos do nosso quotidiano: a fraternal solidariedade do conterrâneo do
carpinteiro moldavo e o amável carinho daquela filha. Nelas reconhecemos as
atitudes de serviço como passagens de abertura capazes de transfigurar as
nossas desumanidades.
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