sábado, 29 de novembro de 2014

ESCUTAR A VIDA



Caríssimas e caríssimos,

durante esta semana fomos descobrindo nos “pensamentos em busca” trilhos de uma peregrinação para o sentido da VIDA. Hoje, na reflexão ESCUTAR A VIDA (ver ANEXO) encontramos sinais reveladores de que a fidelidade à sede que invade o nosso SER conduzir-nos-á sempre a relações humanizadoras.

Fraternalmente,
grão de mostarda


BUSCA DO SENTIDO DA VIDA
AOS ENCONTROS HUMANIZADORES


Não conhecemos este homem magro, de bigode apurado e já com cabelos brancos… Sentou-se na mesa do café com o olhar vazio para a parede de vidro, da qual se avistavam os carros apressados e as pessoas que entravam e saíam dos prédios circundantes.

Pediu à senhora “um café, por favor” com uma pronúncia que confirmava o que a sua fisionomia já transparecera. Perguntámos: “De onde é o senhor?” “Da Moldávia…” A conversa foi dando as voltas da vida daquele homem de 52 anos, mas que parecia já ter mais de 60, porque antes de contar o que fazia, preferiu dizer: “Tenho um curso de carpinteiro, mulher e três filhas na minha terra…”. E logo se percebeu que agora não fazia nada. Fora contractado para trabalhar em Portugal para exercer a sua profissão, mas o patrão português apenas lhe pagara o salário de servente. Aceitou anos a fio aquela situação: “Tinha de aceitar as condições porque a família precisa de comida.” E agora? “Agora estou sem trabalho. E levantando-se, disse: ”Desculpe, vou-me embora, porque aquele parece que me arranjou um trabalho para hoje.” Aquele era um outro homem de idêntica fisionomia que aparecera frente ao vidro do café…

Já era noite. Mesmo assim pensou-se que iam gostar da visita. Encontramos a filha, ainda jovem, perturbada com a situação da mãe. Já havia telefonado durante o dia a dizer que a mãe não poderia ir para a fisioterapia… A senhora, que em Dezembro vai fazer 80 anos, está sentada na cadeira de rodas, bem agasalhada e acarinhada com desvelo pela filha: “A minha mãe já não consegue ir à casa de banho há oito dias e está cheia de dores.” Três dias antes fora ao hospital fazer uma TAC, a pedido de uma fisiatra amiga que se nos oferecera para proporcionar tratamento adequado à situação da senhora, porque onde andara há mais de um ano “não lhe faziam nada”, como a filha sempre se lamentava. A TAC revela metáteses ósseas. “Não pode ir para a fisioterapia, foi o que me disseram no hospital”, diz a filha com o rosto apertado para não deixar saltar as lágrimas. Mas agora o que era necessário era aliviar as dores da mãe… Telefona-se para um hospital onde estaria um médico conhecido. Não estava. Mas a médica de serviço prontificou-se em aceitar a senhora para lhe fazer uma limpeza aos intestinos.

Médica e enfermeira cuidaram em acalmar a filha que, na sua ternura tão amável para com a mãe, não conseguia disfarçar a dor que sentia. Médica e enfermeira trataram com delicadeza infatigável a senhora. Quase três horas depois o seu rosto já estava menos pálido. A filha colocou-a na cadeira de rodas. E enquanto a agasalhava, sussurrando carinhosas palavras de tranquilidade, ela esboçou um sorriso. A humidade da noite exigia maiores cuidados. De regresso a casa, a senhora aceitava, com um olhar suave, os beijos de despedida…

Olhamos os gestos de compreensão e de ternura destes dois momentos do nosso quotidiano: a fraternal solidariedade do conterrâneo do carpinteiro moldavo e o amável carinho daquela filha. Nelas reconhecemos as atitudes de serviço como passagens de abertura capazes de transfigurar as nossas desumanidades.

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