sábado, 21 de março de 2015

ESCUTAR A VIDA



Caríssimas e caríssimos,

a vulnerabilidade humana leva-nos a compreender o “itinerário da inutilidade”. O sofrimento e o desassossego interiores dos mais frágeis interrogam-nos, quotidianamente, pelo sentido da vida. O “desvio de caminho” de um ser humano apenas solicita amabilidade na escuta.

Era um sábado, e ela disse que sim…

Fraternalmente,

grão de mostarda


ELA DISSE QUE SIM…


Ela disse que sim, que no dia do seu aniversário, sábado, aceitava o convite de almoçar connosco, na casa do grão de mostarda. Marcou-se à uma da tarde: “Assim dá-me tempo para preparar a comida para o meu pai, que come ao meio-dia…”

Ficámos felizes. Ela, que depois de mais uma desintoxicação de álcool numa comunidade terapêutica, voltara a recair, reconhecia que sim, que necessitava de apoio: “Não sei o que se passa; tenho os meus irmãos que são tão meus amigos… E pronto!” Não houve recriminações, a conversa seguiu outro rumo: é necessário que ela continue a olhar em frente e não deixe o passado tomar conta do seu coração.

No sábado, meia-hora depois do combinado, resolveu-se telefonar. O pai não sabia dela; admirou-se, porque jugava-a já em nossa casa. Passada mais uma hora, novo telefonema. Estava “enrolada na cama com uma carga…”, disse o pai. Decidiu-se que o melhor era não intervir naquele momento: não estaria capaz de escutar e compreender o quer que fosse.

Dias mais tarde, numa visita a sua casa, reconheceu que sim, que tinha bebido. Porquê? O que anda a perturbá-la? “Não sei…” E a resposta é sempre mesma; igual à que deu quando, junto à nossa porta, totalmente embriagada e com dois pacotes de vinho num saco plástico, garantia que não tinha bebido. Nesse dia, foi preciso levá-la a casa…

Reconhecemos que ainda não conseguimos encontrar o fio à meada; não foi possível desobstruir a barreira que ela tem feito crescer, entre si própria e a sua envolvente familiar e social. Como é difícil descer ao fundo da sua solidão, mesmo que os risos inesperados tenham o som da tristeza e distância que não consegue disfarçar no olhar. Por vezes, julga-se que tudo se resolve; noutras, o abismo parece ser o único limite, inconciliável com o diálogo aberto e franco.

Aos poucos vamos aprendendo a humildade de somente ser presença. Aceitar continuar a permanecer, silenciosamente. Saber escutar as lágrimas deixadas cair logo à chegada ao umbral da porta. No fundo, nunca conheceremos a totalidade de nenhum ser humano. E ela torna-se um desafio para aceitarmos a “inutilidade” da nossa presença de “vizinhos entre vizinhos”…

grão de mostarda

segunda-feira, 16 de março de 2015

PENSAMENTO EM BUSCA




Dos troncos das árvores soltam-se já as flores que nos embriagam com a sua policromia; de plantas viçosas começam a brotar pequenos rebentos que se hão-de transformar em pequenos frutos silvestres… Toda a Natureza está RESSURGIR por si mesma, enquanto nós seguíamos, distraídos, as nossas rotinas.
Esta semana, coloco uma flor num pequeno vaso em cima da mesa e, silenciosamente, vou apreciando a sua presença.




Foto: Mosteiro de Armenteira
grão de mostarda

domingo, 15 de março de 2015

ESCUTAR A VIDA



Caríssimas e caríssimos,
há já alguns anos, Ricardo Brochado teve a ousadia de preservar um conjunto bibliográfico, com exemplares com mais de um século, e que, então, iria ser destruído…
Ainda em Fevereiro todos ficámos consternados perante a destruição de peças do Museu de de Mossul (Iraque), datadas entre os séculos VIII e VII a.C., bem como da eliminação de vestígios de Nimrud, no passado dia 5. Fundada no século XIII a.C. era uma das raras jóias da cultura assíria…
O património da Humanidade – material e imaterial – tem sido ciclicamente devastado por obscuros “tempos de morte”. É como retirar a um corpo um pedaço da sua essência. Preservar é permitirmo-nos estar atentos: o futuro é construído pelo agora e Ricardo Brochado compreendeu, e empenhou-se, nessa tarefa de humanidade, iluminadora das nossas vidas individuais e da história comum de todas e todos nós. Hoje o seu gesto de há anos permitiu que alguém, do outro lado do mar, desse continuidade a uma investigação em favor da Humanidade…
Fraternalmente,
grão de mostarda


O futuro construído no agora…


No princípio do milénio corrente, passava numa das ruas do Porto quando me deparei com uma carrinha de caixa aberta carregada de sacos do lixo. Aproximei-me e percepcionei que dentro dos sacos se encontravam livros. Intrigado constatei que se tratava de livros do século XIX.

Falei com os homens que estavam a carregar o veículo e fui informado que tinham sido mandatários pelo dono de uma galeria de arte, ali vizinha, que se desfizessem daquilo. Um deles, humilde mas mais informado que o “taliban” do patrão, sugeriu que se chamasse um dos alfarrabistas da rua ao lado ao que lhe responderam: “Vai tudo para o lixo, nem para a reciclagem.” 

Perguntei se podia levar um saco ao que me disseram que até os podia levar todos. Assim fiz e levei para casa 3500 amigos das mais variadas temáticas, na sua maioria com mais de cem anos.

Esta semana recebi um email de um doutorando em tradução brasileiro, que me perguntava por um desses livros que necessitava para os seus estudos e não encontrava em lado nenhum. Eu tinha três cópias e cedi-lhe uma. Explicou-me que aquele livro o ia ajudar imenso no aperfeiçoamento do estudo do processo de tradução ao longo dos tempos. Fiquei feliz.

A cultura que o ser humano foi criando ao longo dos tempos vai sendo aperfeiçoada com todos os contributos de uma comunidade distribuída pelo tempo. É pena que pessoas, como o proprietário de uma galeria de arte bem como terroristas que destroem preciosos vestígios da nossa cultura, não estejam no mesmo comprimento de onda que o resto da Humanidade.

Ricardo Brochado


segunda-feira, 9 de março de 2015

PENSAMENTO EM BUSCA



O livro dos provérbios (3, 13-14) diz: “Feliz o homem que encontrou a sabedoria e adquiriu a inteligência, porque a sua conquista vale mais que a prata e o seu lucro é melhor que o ouro fino.” O coração e a mente são imprescindíveis e não podem ser separados na nossa busca do sentido da vida, na nossa busca de felicidade.




grão de mostarda