Caríssimas e caríssimos,
escrita em cativeiro, há
quase quatro décadas, uma carta de Nelson Mandela abordava questões que, à
partida poderiam parecer despropositadas para um homem condenado a prisão
perpétua. O conhecimento pessoal e a conduta humana constituía praticamente o
seu conteúdo…
Em que consiste a
santidade? Thomas Merton (1915-1968) responde-nos: “Para mim, ser santo
significa ser eu mesmo”, concluindo: “Por isso o problema da santidade (…) é,
na realidade, o problema de chegar a saber quem sou eu e descobrir o meu
verdadeiro ser” (1).
Ao recordar-nos um
excerto da carta de Mandela, Paula Guerreiro desvela-nos a actualidade e o que
de comum têm o pensamento do então líder anti-apartheid Nelson Mandela e as
palavras do monge cisterciense Merton: o encontro com o nosso ser mais
profundo, conduz-nos a caminhos de bondade, tão urgentes no tempo presente.
(1) “Nuevas semillas de
contemplacíión” (Santander, 2003)
Fraternalmente,
grão de mostarda
Uma carta inspiradora
Excerto de uma
carta de Nelson Mandela a Winnie Mandela, na ocasião sua esposa, escrita na
prisão sul-africana de Kroonstad, e datada de 1 de Fevereiro de 1975.
A sua profundidade, autenticidade e beleza é maravilhosa e
simultaneamente inspiradora. A mim faz-me bem lê-la e transmite-me uma enorme
serenidade.
Paula
Guerreiro
“… a cela é o lugar
ideal para nos conhecermos a nós próprios, para aprofundarmos de forma realista
e regular os processos da nossa mente e dos nossos sentimentos. Ao avaliarmos a
nossa evolução enquanto indivíduos tendemos a concentrar-nos em fatores externos
como a posição social, o poder de influência e a popularidade, a riqueza e o
nível de instrução. Estes são, de facto, fatores importantes para a avaliação
do sucesso individual no que se refere a aspetos materiais e é perfeitamente
compreensível que muitas pessoas se empenhem em alcançá-los.
Existem no entanto
fatores internos que podem ser ainda mais decisivos na avaliação de uma pessoa
enquanto Ser Humano: a honestidade, a sinceridade, a simplicidade, a humildade,
a generosidade, a ausência de vaidade, a disponibilidade para ajudar os outros
– qualidades ao alcance de todas as almas – constituem os alicerces da vida
espiritual de cada um de nós. A evolução em matérias desta natureza é
impensável sem uma introspeção séria, sem nos conhecermos a nós próprios, sem
conhecermos as nossas fraquezas e os nossos erros.
No mínimo, se não
nos der mais nada, a cela proporciona-nos a oportunidade de analisarmos todos
os dias a nossa conduta na sua globalidade, de ultrapassarmos o que de mau
houver em nós e desenvolvermos o que possamos ter de bom. A meditação
frequente, nem que seja durante 15 minutos por dia, antes de adormecer, pode
ser muito proveitosa a este respeito. No início pode parecer-nos difícil
identificar os aspetos negativos da nossa vida, mas com perseverança este
exercício poderá revelar-se altamente compensador. Não devemos esquecer que um
santo é um pecador que não cessa de se esforçar” (*).
(*) Edição portuguesa: “Arquivo íntimo de
Nelson Mandela”, Editora Objectiva
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