Caríssimas e caríssimos,
Por vezes o tempo de
férias torna-se um turbilhão de actividades: há que conhecer tudo, ver todos os
sítios e monumentos que nos aconselharam a não perder; comprar e provar tudo o que
é especialidades gastronómicas; experimentar a multidão das praias… Depois,
somos confrontados com as exigências da rotina: com o dia-a-dia familiar e do
trabalho. E o descanso, o encontrarmo-nos, a nós mesmos e aos nossos – que por
vezes vemos de fugida à noite, durante praticamente todo o ano – o merecido
tempo livre acaba sempre adiado…
Álvaro Carvalho, nesta
semana, propõe-nos uma reflexão sobre o uso do tempo livre, a liberdade de
usufruir do tempo, não porque tem que ser, mas para gozar a existência desse
tempo. A inspiração recebeu-a de um trecho do livro “Só avança quem descansa”,
do jesuíta Vasco Pinto Magalhães.
Fraternalmente,
grão
de mostarda
Tempo livre ou um tempo de liberdade
Neste regresso de férias estou confrontado
com múltiplos afazeres profissionais, cursos de formação e outros… No meio de
tanta azáfama retomei a leitura do livro “SÓ AVANÇA QUEM DESCANSA”*, do qual
partilho um excerto
Álvaro Carvalho
“Se isto é assim, talvez seja bom encontrar
alguns modelos de vida mais saudáveis, algumas estratégias que nos permitam
utilizar melhor o tempo. E, se calhar, para isso ajudava--nos ler o Evangelho
de outra maneira.
Já pensaram como é extraordinário Cristo ter
tido tempo para realizar tanta coisa em apenas três anos! E Jesus “deu-se ao
luxo” de estar trinta e tal anos sem fazer nada! Dedicado ao ócio, isto é, a
aprender a ser gente, a estabelecer relações, a maturar o afecto, a ligar-se à
vida, a conhecer o seu mundo, a perceber o seu povo, as suas tradições e
religião.
Esse tempo a que chamamos “vida oculta” é uma
mensagem, não está ali por acaso! De facto, esta desproporção aparente no uso
do tempo por Jesus é, na realidade, um equilíbrio bem conseguido. Devia
fazer-nos pensar, por exemplo, como entendemos, hoje, aquilo que chamamos
equilíbrios nesta matéria. A gestão do tempo é sempre um equilíbrio. Mas os
equilibrismos que nós fazemos tornam-nos por vezes ainda mais escravos do
tempo, porque o nosso tempo livre não
é um tempo de crescimento, um tempo de liberdade.
O meu tempo livre é um tempo de liberdade? Na
maior parte das vezes não é. É um intervalo entre duas maçadas, em que eu não
sei o que hei-de fazer, onde me sinto alienado, um “bocado” que custa a passar
ou se aproveita para disparatar: o que não significa descansar! Mas tempo
livre, como tempo de liberdade, é algo sem o qual não podemos viver bem. E é
pena que não entre nas nossas agendas este conceito de tempo livre!
Eu também tenho uma agenda horrorosa,
assustadora para toda a gente que olha para ela! Tenho muita consciência disto,
e bastante experiência da sua difícil gestão. Não sendo mais que os outros ando
a refletir sobre os espaços livres, como aumentar-lhes a qualidade: vou
arranjando coragem para “ perder tempo”… ou seja arranjar tempo para a liberdade,
para o não rentável, mas mais relacional: que tenha mais a ver com a minha
vontade libertada, com o coração pobre e obediente ao essencial – o que tira
muito stress! Não vá tornar-me no
homem atarefado e importante mais pelo que faz do que pelo que é. Escravizado
pelo “tem de ser”; mas, depois, nem sequer sabe quem é!”
* Vasco Pinto de Magalhães, s.j., “SÓ AVANÇA
QUEM DESCANSA”, Tenacitas, 2012
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