Caríssimas e caríssimos,
uma “boa notícia”, é o
que nos oferece nesta semana Paula Guerreiro. A sua reflexão ESCUTAR A VIDA
abre-nos o espaço da intimidade afável e compassiva de uma família inteira para
com um dos seus membros com doença de Alzheimer.
O sofrimento e a dor não
podem, em si mesmos, ser considerados vias de “regeneração” ou de “elevação”
pessoal ou espiritual. Mas a fragilidade e as situações limite de cada uma e
cada um de nós podem suscitar o (re)encontro com o mais profundo do coração humano:
a bondade, a bondade nascida de uma gratuidade absoluta…
O irmão
Roger de Taizé ressaltava sempre que Deus, ao procurar-nos, não descobre um
monte de escolhos, mas “encontra em nós a beleza profunda da alma humana”. É
precisamente o que, na sua reflexão ESCUTAR A VIDA, Paula Guerreiro nos
desvela: “a manifestação de um Amor maior.”
Fraternalmente,
grão de mostarda
A BELEZA
PROFUNDA DO SER HUMANO
Um olhar vazio, neutro, parado e apático. É
este o espelho do teu rosto. É esta a tua expressão. Há muito que o Alzheimer
tomou conta de ti, da tua mente e do teu corpo. Já não conheces os teus filhos,
os netos, a tua família ou os teus amigos. Já não te reconheces. Mas sabes, a
tua família conhece-te e lá em casa tu contas: és a mãe, és a avó e és a amiga
que está presente. Há gestos bonitos de se ver…
Não entra ninguém em casa que não te
cumprimente e se envolva contigo em manifestações de carinho. Não sai ninguém
de casa, sem primeiro, chamar pelo teu nome e despedir-se de ti. Todos te
tratam com um respeito e uma dignidade humana comovente. A vida é reorganizada
em função dos cuidados a ter contigo. Não tens autonomia para as coisas mais
básicas e elementares do dia-a-dia, seja para cuidar da higiene pessoal, para
te vestires ou te alimentares. Porém, todos se ocupam de ti com uma preocupação
constante para que te sintas confortável.
As limitações são imensas. A capacidade de
locomoção é nula. A comunicação é inviável. Da tua boca não sai uma palavra.
Mas sabes, os que te amam continuam a interpelar-te. Basta encostar o rosto aos
teus lábios que se recebe um beijo. É espantosa a tua expressão, tão doce e
serena. Não dizes se tens frio ou calor, se tens fome ou sede ou se estás
triste. Mas sabes, por vezes recebe-se um sorriso teu. O beijo, o sorriso têm
sabor a milagre e nem imaginas a festa que é quando isto acontece.
Conheço muito
bem o seio familiar que acabo de retratar o cuidado, o carinho, a dedicação e o
empenho que esta família coloca no bem-estar da doente. A família devolve-lhe a
dignidade que a doença lhe retirou. É admirável e louvável. É a manifestação de
um Amor maior, gerado no seio do amor familiar. É uma Bênção e uma Graça
compreender e ver a presença deste Amor. É o evangelho a acontecer, uma boa
notícia.
Paula Guerreiro
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