Caríssimas
e caríssimos,
a
vulnerabilidade humana leva-nos a compreender o “itinerário da inutilidade”. O
sofrimento e o desassossego interiores dos mais frágeis interrogam-nos,
quotidianamente, pelo sentido da vida. O “desvio de caminho” de um ser humano
apenas solicita amabilidade na escuta.
Era
um sábado, e ela disse que sim…
Fraternalmente,
grão de mostarda
ELA DISSE QUE SIM…
Ela disse que sim, que no dia do seu
aniversário, sábado, aceitava o convite de almoçar connosco, na casa do grão de
mostarda. Marcou-se à uma da tarde: “Assim dá-me tempo para preparar a comida
para o meu pai, que come ao meio-dia…”
Ficámos felizes. Ela, que depois de mais uma
desintoxicação de álcool numa comunidade terapêutica, voltara a recair,
reconhecia que sim, que necessitava de apoio: “Não sei o que se passa; tenho os
meus irmãos que são tão meus amigos… E pronto!” Não houve recriminações, a
conversa seguiu outro rumo: é necessário que ela continue a olhar em frente e
não deixe o passado tomar conta do seu coração.
No sábado, meia-hora depois do combinado,
resolveu-se telefonar. O pai não sabia dela; admirou-se, porque jugava-a já em
nossa casa. Passada mais uma hora, novo telefonema. Estava “enrolada na cama
com uma carga…”, disse o pai. Decidiu-se que o melhor era não intervir naquele
momento: não estaria capaz de escutar e compreender o quer que fosse.
Dias mais tarde, numa visita a sua casa,
reconheceu que sim, que tinha bebido. Porquê? O que anda a perturbá-la? “Não
sei…” E a resposta é sempre mesma; igual à que deu quando, junto à nossa porta,
totalmente embriagada e com dois pacotes de vinho num saco plástico, garantia
que não tinha bebido. Nesse dia, foi preciso levá-la a casa…
Reconhecemos que ainda não conseguimos
encontrar o fio à meada; não foi possível desobstruir a barreira que ela tem
feito crescer, entre si própria e a sua envolvente familiar e social. Como é
difícil descer ao fundo da sua solidão, mesmo que os risos inesperados tenham o
som da tristeza e distância que não consegue disfarçar no olhar. Por vezes,
julga-se que tudo se resolve; noutras, o abismo parece ser o único limite,
inconciliável com o diálogo aberto e franco.
Aos poucos vamos aprendendo a humildade de
somente ser presença. Aceitar continuar a permanecer, silenciosamente. Saber
escutar as lágrimas deixadas cair logo à chegada ao umbral da porta. No fundo,
nunca conheceremos a totalidade de nenhum ser humano. E ela torna-se um desafio
para aceitarmos a “inutilidade” da nossa presença de “vizinhos entre vizinhos”…
grão
de mostarda
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