Caríssimas
e caríssimos,
De que mundo somos? Todos os dias o coração nos coloca esta questão, quer seja a propósito de decisões pessoais ou de situações experimentadas colectivamente. E a partir dela, durante um ano, Luísa Alvim e Valentim Gonçalves aceitaram o convite do grão de mostarda de a refletir juntos, em jeito de cartas. E num momento do mundo, e do país, em que se nos colocam interrogações a sistemas que tínhamos como adquiridos, a nível social, político, financeiro e mesmo religioso, as cartas de Luísa Alvim e de Valentim Gonçalves constituíram, na verdade, janelas de esperança... Outras cartas surgirão, a partir de Outubro.
Hoje, escrevemos a carta (ver ANEXO) que encerra este arco daquelas reflexões, e que culminará num encontro-diálogo com a Luísa Alvim e o Valentim Gonçalves no próximo sábado, dia 7 de Julho. Renovamos-vos o convite (programa em ANEXO).
? Na inscrição (através de mail ou pelo Facebook), INDIQUEM DE QUANTAS PESSOAS VÊM ACOMPANHADAS/OS), PELO MENOS ATÉ AMANHÃ, DIA 1 DE JULHO. A principal razão por que solicitamos esta confirmação deve-se a uma questão prática: a confecção do almoço.
? Agradecemos ainda nos informem (até amanhã, também) SE NECESSITAM DE DORMIDA. Quer seja para a noite de 6 para 7 de Julho ou de 7 para 8 de Julho.
? A quem já se inscreveu, por mail ou Facebook (ver Eventos), MAS NÃO ENVIOU AQUELAS INDICAÇÕES, agradecemos que o façam, também até amanhã, dia 1 de Julho.
Com estima fraterna,
grão de mostarda
Caríssima Luísa e caríssimo Valentim,
relendo as vossas cartas De que mundo somos?, escritas entre
Junho de 2011 e Junho deste ano, ecoam-nos as seguintes palavras do livro de
Jeremias: “Os meus desígnios para vós são de paz e não de tribulação; quero
dar-vos um futuro e uma esperança” (1). Atribuindo este oráculo a Deus, o
profeta dirige-o à porção do povo judeu que se encontrava no cativeiro da
Babilónia.
A urgência da esperança é a convicção mais vezes manifestada nas vossas cartas. E as razões por que a
expressastes conduziram-nos a Jeremias, homem atento às causas que levaram à
submissão do seu povo: as palavras e os comportamentos enganosos dos próprios
dirigentes, religiosos e políticos, e os interesses gananciosos de países
estrangeiros. A presente perturbação social e política provocada pelo sistema
financeiro, sentida em particular na Europa e, consequentemente, no nosso país
– tão assiduamente reflectida nas vossas cartas
–, remeteu-nos à situação vivida pelos judeus, 600 anos antes de Jesus.
Jeremias não se deixou vencer pelo desterro dos seus irmãos: “Construí
casas e nelas habitai, plantai pomares e comei seus frutos, casai-vos e gerai
filhos e filhas...” (2). Nunca se submeteu ao desânimo,
apelando sempre a uma atitude de perseverança. E por isso anunciou: “Deus quer
dar-vos um futuro e uma esperança”.
Também, das vossas cartas, acolhemos
idêntico apelo que, em nós ganha raízes fundas a favor de uma esperança actuante, praticada no
quotidiano das incertezas no qual os diversos poderes nos querem submergir.
“Na significativa mudança de paradigma que estamos a viver e que
afecta o mundo, a política, a economia e as culturas, necessitamos com urgência
de uma ‘visão’ que procure vislumbrar o contorno de um mundo mais pacífico,
mais justo, mais humano” (3).
Recorda Hans Küng, teólogo da esperança que, no seu livro acima citado, nos
previne: “A primeira coisa que necessita a pessoa, toda a pessoa, é a confiança
na vida, uma confiança radical”.
Mas onde ir buscar a luz e o ânimo, para que seja possível empreender
uma caminhada de confiança total na vida, geradora de esperança?
As propostas de Jeremias podem constituir hoje um manual capaz de
iluminar e animar uma decisão pessoal, que inevitavelmente tem de ir sendo
construída e, depois, assumida no nosso interior. Sobre esta opção são
elucidativas as palavras do irmão Roger: “Uma paz sobre a terra prepara-se na
medida em que cada um se atreve a perguntar-se a si próprio: estou disposto a
buscar a paz interior, a avançar desinteressadamente? (...) Há aqueles que são
portadores de paz e de confiança onde há choques e oposições. Inclusivamente,
permanecem firmes quando a prova ou o fracasso pesam sobre os ombros” (4).
É sempre necessário correr riscos, ser fermento, enquanto a nossa
vida, pouco a pouco, se vai convertendo em caminho
de confiança e em lugar de esperança na
Vida. Nada é imediato, nas verdadeiras decisões humanas, naquelas de que
resultam uma mudança profunda.
Por onde começar? Como Jeremias aponta, por decisões pessoais que, aos
poucos, se alargam a outros corações, a outras vontades já despertas para
“avançar desinteressadamente”, na expressão do irmão Roger (5). Em cada lugar, em cada circunstância será possível discernir
razões, espaços e vontades que tornarão possíveis os sonhos de quem já procura
“vislumbrar o contorno de um mundo mais pacífico, mais justo, mais humano” (3). Outras
decisões poderão avançar para uma organização mais ampla, mais global com vista
a exercer o direito de alterar os sistemas político-financeiros degradados e
injustos pelo “novo paradigma de uma política mundial mais pacífica” (3). Pacífica,
por ousar defender os mais frágeis; por ousar integrar e nunca excluir...
Com estima
fraterna,
grão de mostarda
(1)
Jeremias 29, 11
(2)
Jeremias 29, 5
(3) Lo que yo creo
(Editorial Trotta, Madrid, 2011)
(4) “La paz empieza
en nosotros mismos” in Presientes una felicidad? (PPC, Madrid, 2006)
(5) “Quem quiser seguir-me, negue-se a si mesmo, carregue a sua
cruz e siga-me” (Marcos 8, 34). Jesus e os seus conterrâneos conheciam bem o
que os militares exigiam aos condenados à morte por Roma: tinham de transportar
sobre os ombros a trave transversal da sua cruz. Ou seja, um despojamento total
da sua própria imagem... Negar-se é vencer o seu próprio egoísmo, abandonar os
interesses mais pessoais, a sua própria auto-imagem, nascida do ego.
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