sábado, 1 de dezembro de 2012

ESCUTAR A VIDA



Caríssimas e caríssimos, 

O padre Henrique é missionário… viveu muitos anos, na Pedreira dos Húngaros, partilhando uma barraca (de madeira) com outros missionários, naquele que foi considerado o mais problemático bairro da Grande Lisboa. Os seus moradores foram entretanto realojados.

Hoje, a sua reflexão (ver ANEXO) deixa transparecer a sabedoria de escutar das pessoas “que nos contam o lado positivo da vida”; uma sabedoria nascida de um quotidiano partilhado em simplicidade…
Com estima fraterna,

grão de mostarda


Escutar a vida…


Já tenho idade para escutar mais do que agir. Mas o “bicho” que sou, apanha-se ainda na precipitação, às vezes, antes de refletir e tentar compreender o que se passa com quem se aproxima, que fala, que quer comunicar algo por me conhecer, ter-me como amigo, considerar-me pessoa para conversar e não encontrar um “muro de aço”. Ai, a vida humana, como ela é complicada!

Que cuidado devemos ter para compreender que as relações mútuas são essenciais para a felicidade de cada um. Não que uma felicidade escangalhada não se possa restaurar. Pode restaurar-se o que não devia ter acontecido. Diz-me um jovem restaurador a quem pedi que tratasse duma imagem do Coração de Jesus oferecida em muito mau estado e sem uma mão: “o meu trabalho vai durar 3 meses; tenho que fazer isso fora de horas”. Levou cinco, em especial por causa de colocar uma mão. Foi tarefa delicada e de muita paciência. Escutar a vida é delicado; se calhar não é dado a todos. Já afirmei, acima, de me apanhar em precipitações que podem fechar a quem precise de alguém que escuta. Não me levem a mal, leitoras e leitores desconhecidos, iniciar desta forma o que se segue.

Na paróquia, a nobre actividade da Catequese junta, aos sábados, não só crianças e adolescentes mas também muitas mães e alguns pais. É boa oportunidade para dois dedos de conversa que se tornam facilmente na escuta da vida. 

Foi o caso quando perguntei a uma das Marias: “Tem trabalho?” “Oh, padre, nunca me preocupo com isso”. A minha pergunta desencadeou os tais dois dedos. Afirmou-me que já lhe aconteceu mais que um despedimento, mas quem procura e aceita qualquer trabalho consegue encontrá-lo. Com ela é assim. E, sorridente, esperava o fim da catequese da filha para a levar com ela. Esta Maria não foi a primeira a afirmar semelhante alegria. Alegrei-me com ela, pois é tão bom encontrar pessoas que nos contam o lado positivo da vida e que expressam, em poucas palavras, o resultado do seu esforço. A sua alegria multiplica-se nos familiares e amigos com quem priva. Passaram-se três semanas e de novo se proporcionou encontrar-nos e, de imediato, sai-se com esta: “Padre tenho mais um trabalho! Está a ver?”. Eu estava mesmo a ver na cara a sua grande satisfação por me poder contar isto. Quem nos dera escutar milhares doutras mulheres e homens satisfeitos e alegres, a partilhar as suas alegrias com amigas/os da sua vida. As alegrias existem, as alegrias contagiam, as alegrias escutam-se…

Henrique Scheepens, padre da Congregação dos Sagrados Corações e co-responsável da paróquia católica de S. Bartolomeu da Charneca (Lisboa)


















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